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sábado, 22 de outubro de 2011

Carta ao André

Caro André,

Precisei de um tempo para escrever esta carta e espero que você a receba.

Há um mês fui ao Memorial da Igualdade em Macaé para lhe prestar uma última homenagem, pela amizade de longa data e mais recentemente pelos ideais e idéias que compartilhamos. Infelizmente você partiu aos 43 anos para outras paragens e nossas conversas foram interrompidas temporariamente. Naquele dia 16 o clima era de muita dor e tristeza, ainda mais pelas circunstâncias trágicas nas quais você deixou essa existência.

Ao longo do velório, enquanto sua família recebia o amparo de parentes e amigos, observei que há anos não via juntos tantos contemporâneos e conterrâneos. Naquele momento percebi que a face triste de muitos ali presentes revelava feições bem conhecidas. Eram pessoas que fizeram parte de uma geração de macaenses que até a juventude não vivenciou a atmosfera pesada que hoje paira sobre a cidade. Eram outros tempos, mais amenos e sem as atrocidades dos dias atuais. Víamos mais sorrisos que lágrimas.

Enquanto a urna aos poucos ia deixando a capela, fiquei divagando e lembrando um pouco da adolescência de quase todos nós. A Rua Dr. Luis Bellegard era o “caminho oficial” das tardes e noites de sexta e sábado para se chegar até à Imbetiba, ponto de encontro dessa geração. Passávamos por ali tranquilamente, qualquer que fosse a hora. Aliás, você morava nessa rua com seus pais, Seu Argentino e Dona Carminha, e seus irmãos. Primeiro conheci Mônica, depois Carlos e então você e Ricardo, um garotinho naquele tempo (rs). E quem diria que seu amigo Maurício Babinha se tornaria meu cunhado? Mundo pequeno!

Quem viveu essa época vai lembrar das noites de Macaé e das opções para dançar. E o que havia? Discoteca Starship, no Tênis Clube, Discoteca do Redondo, Cavern Club e Tucano, fora os bailes com equipes de som no Fluminense e Ypiranga. Brigas e confusões poderiam acontecer, mas eram resolvidas de maneira menos agressiva que atualmente.

Durante o dia o destaque ia para a Praia dos Cavaleiros e do Pecado. As ondas estavam lá nos esperando, seja com prancha ou pés-de-pato. As ressacas eram de dar medo e só os mais ousados (ou malucos!) entravam na água! E as meninas na areia, enfeitavam a praia com seus cabelos e bronzeados.

As segundas-feiras tinham como endereço certo os cinemas Cine Clube e Taboada, com direito à pipoca e lanterninha. Seu João de Deus, que esteja em bom lugar, depois de aturar tantos anos de bagunças dessa rapaziada. Não sei você lembra, mas alguns anos depois surgiu a Casa de Chocolate, onde as partidas de Detetive não tinham hora para acabar, a não ser quando Seu Vasco mandava a turma para casa.

Naqueles tempos a gente se reunia na casa de amigos para ouvir música, fosse com um violão ou cada qual levando seus discos de vinil. A trilha sonora ia de mpb e rock ao funk, de acordo com a casa onde íamos: Led Zeppelin, Chico Buarque, Funkadelic, Gilberto Gil, Queen, Fagner, The Police, Dire Straits, Zé Ramalho, Nazareth etc. Nesses encontros sempre havia alguém com uma fitinha cassete para guardar as preferidas. E na sua casa era impossível deixar os Beatles de fora das audições, haja vista a Mônica ser beatlemaníaca de carteirinha. Foi lá que descobri uma pérola desse grupo que resolvi adotar como um tema pessoal: Strawberry Fields Forever.

O tempo passou, os macaenses ficaram um pouco mais velhos e cada qual optou por um caminho. Alguns saíram da cidade para estudar mas depois voltaram; outros nunca saíram daqui e houve aqueles que foram sem voltar. Vieram os casamentos, filhos, separações etc. Você e Daniele resolveram trazer Clarinha como irmã caçula das meninas. Quanta alegria!

As lembranças vinham fluindo em minha mente mas então, de volta ao presente! Não sei quantos abracei naquela tarde, num misto de saudade e melancolia. Cada um de nós se olhava parecendo dizer “Não acredito nisso!”, “Não é possível!”.

Ao fim da tarde, com orações sinceras e aplausos, nos despedimos. Vejo sua esposa, filhas, irmãos, cunhadas, primos. Não tenho palavras. Abraços e lágrimas falam por si. As saudades ainda vão machucar familiares e amigos, e só o tempo e a confiança em Deus vão segurar as pontas.

Gostaria muito que todos nós que estivemos juntos nesse dia também pudéssemos estar reunidos em algum momento para celebrar a vida e a família. Vale lembrar que fomos abençoados porque tivemos a oportunidade de usufruir momentos singelos de uma cidade terna, serena e pacata, sem a perversidade dos dias atuais. São momentos que ficarão eternizados em nossos corações.

André, agradeço a oportunidade de ter conhecido você e compartilhado um pouco do convívio de sua família e de amigos. Que Deus o ampare na nova morada e até uma próxima vez. Precisamos continuar aquela conversa, ok?

Abraços,
Alfredo.

(Macaé nos anos 80)

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Crônica de uma morte anunciada

As redes de televisão noticiam o episódio dramático das inundações, não só no Brasil mas também em outros países, como tem acontecido recentemente na Austrália. Fala-se em tragédia, mortes etc por conta das chuvas fortes e logicamente devemos estar sensíveis a esses problemas, já que são nossos semelhantes que sofrem pelo episódio. Aliás, sensíveis e atentos...

De acordo com a edição de 1996 do World Almanac, publicação da Infobase Publishing, New York, o século XIX teve, registrados em todo o mundo, 938 mil óbitos devido a três grandes inundações. Já no século XX os números foram bem maiores, com 93 grandes inundações em nível mundial, conforme mostrado no gráfico, e aproximadamente 4 milhões de óbitos.

Um relatório do IBGE de 2000 cita seis fatores agravantes para o caso de inundações ou enchentes no Brasil: adensamento populacional, dimensionamento inadequado de projetos, obras inadequadas, lençol freático alto, interferência física no sistema de drenagem e obstrução de bueiros, bocas de lobo etc. O mapa a seguir mostra os municípios brasileiros afetados por inundações entre 1998 e 2000.

O que me causa mais tristeza que as consequências das inundações é ver a atitude dos pseudo-governos pelo Brasil afora, que continuam deixando o planejamento urbano de lado e permitem construções em áreas de risco, como é o caso do Bairro Caleme em Teresópolis, que foi densamente ocupado nos últimos anos a partir de loteamentos, muitos deles legalizados.

Áreas destruídas pela chuva em Teresópolis.
Foto: Antonio Lacerda/EFE

Lembro que muito antes da época das chuvas fortes terem alagado diversas cidades no Sul, alguns especialistas da UFSC haviam realizado um estudo e alertado o governo estadual sobre os riscos da ocupação de diversas áreas próximas à cabeceira e margem de rios, encostas e outras áreas com potencial risco de deslizamento e/ou inundação, sugerindo também a necessidade de obras que minimizassem essas condições. Os alertas não foram levados em consideração e o preço foi, como em outras situações, morte e destruição.

As chuvas são fenômenos naturais cujo comportamento vem sendo influenciado negativamente pelo homem. Apesar dessa situação ruim é perfeitamente possível mapear uma cidade, utilizando tecnologias que se tornam cada vez mais acessíveis às prefeituras, e num esforço coordenado identificar as possibilidades de problemas advindos da urbanização e da interferência humana, que na maioria das vezes é feita de forma desordenada e sem nenhum planejamento prévio. A partir desses dados os gestores públicos podem planejar ações que venham a reduzir esses impactos ou, dependendo do caso, extinguir os riscos.

Moradores e Defesa Civil trabalham no resgate de pessoas em Teresópolis.
Foto: Vanderlei Almeida/AFP


As notícias sobre as chuvas recentes parecem, em síntese, a crônica de uma morte anunciada. Existem soluções técnicas para boa parte desses problemas, que podem ser postas em prática por intermédio de políticas públicas sérias, mas isso sempre esbarra em...questões políticas!? Até quando será assim?

Ironias à parte, vejam o detalhe na parte superior esquerda da foto abaixo...precisa dizer mais o quê?

Até a próxima.

http://veja.abril.com.br/blog/veja-acompanha/files/2011/01/Travessia-na-Estrada-do-Triunfo-Caleme2.jpg
Homem usa pinguela improvisada para atravessar o que já foi uma rua no bairro Caleme, em Teresópolis

Foto de Sylvio Maffei/Teresópolis Jornal


quinta-feira, 8 de julho de 2010

O Imperialismo capitalista não perdoa!

Hoje li uma notícia veiculada pela agência Reuters que transcrevo abaixo, destacada em azul:

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CNN demite editora por frase no Twitter

Qui, 08 Jul, 10h09

WASHINGTON (Reuters) - A CNN demitiu uma editora de noticiário do Oriente Médio por causa de uma mensagem no Twitter em que ela manifestava "respeito" por um ex-dirigente do Hezbollah morto no fim de semana, disseram jornais na quinta-feira.

Octavia Nasr trabalhou durante 20 anos na emissora. No domingo, repercutindo a morte de uma das principais autoridades religiosas xiitas, ela escreveu no microblog: "(Fiquei) triste por saber do falecimento do Sayyed Mohammed Hussein Fadlallah ... Um dos gigantes do Hezbollah que eu respeito muito."

Segundo relato do jornal The New York Times, alguns simpatizantes de Israel viram a mensagem quase imediatamente e ficaram indignados.

Parisa Khosravi, vice-presidente-sênior da CNN International Newsgathering, afirmou em um memorando interno citado pelo Times que "teve uma conversa" com a editora e "decidimos que ela irá deixar a companhia".

Procurada pela Reuters, a CNN não se manifestou. Ao Times, um porta-voz da emissora disse que "a CNN lamenta qualquer ofensa que a mensagem dela pelo Twitter possa ter causado".

"Ela não atendeu aos padrões editoriais da CNN. Este é um assunto sério que será tratado adequadamente."

Fadlallah apoiou a República Islâmica do Irã e tinha contatos também com políticos xiitas do Iraque. Foi também líder espiritual e mentor do Hezbollah quando da sua formação em 1982, logo depois da invasão israelense no Líbano. Posteriormente, deixou o grupo por discordar da sua aproximação com o Irã.

Os EUA e Israel consideram o Hezbollah como um grupo terrorista.

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Bem, essa notícia me remeteu a dois pensadores: Milton Santos e José Saramago.

Há alguns anos atrás o Prof. Milton Santos afirmava que 95% do mercado de mídia internacional eram controlados por um único grupo. Para confirmar essa afirmação bastava ver o formato e as tendências dos telejornais, jornais e revistas impressas, via web etc, cujo conteúdo é similar em tudo. Até mesmo a roupa e o penteado dos apresentadores segue um padrão.

Prof. Milton Santos

O escritor José Saramago dizia que a democracia existente é uma falácia e não é discutida como deveria. Em uma de suas frases célebres ele afirma que "o poder do cidadão se limita hoje, na esfera política, a tirar um governo de que ele não gosta e colocar outro que talvez ele venha a gostar".

José Saramago

Esses dois dão o que pensar em seus textos. É uma pena que eles não estejam mais entre nós suscitando esse tipo de discussão para que as novas gerações reflitam e não aceitem tão facilmente o que é imposto por uma minoria sórdida, cujos catequisadores estão entre nossos familiares, professores, políticos e por aí vai.

Aliás, num quadro bem triste e pintado de cinza escuro, vê-se a universidade pública, que deveria ser um berço de reflexão contra esse tipo de visão míope da realidade, contaminada e infectada por indivíduos politiqueiros que ocupam "cargos de confiança" e comungam das mesmas idéias da minoria perversa.

Possivelmente teremos em breve notícias, via CNN, do Irã sendo invadido por Israel (logicamente apoiado pelos EUA) e mostrando que os iranianos comem criancinhas. Bem, isso se o mundo não acabar em 2012 como apregoam os adeptos da moda do calendário maia.

O imperialismo capitalista que está aí não perdoa seus opositores e os extirpa sem dó nem piedade, e o fato que aconteceu com essa jornalista é um exemplo claro do funcionamento do sistema, pois ela mexeu em casa de marimbondo. Esse é o nosso "admirável mundo novo", pegando carona nas idéias de Aldous Huxley, um mundo maravilhoso repleto de tecnologias milagrosas, computadores, HDTV, silicone, mães de aluguel, botox etc, mas que anda em completa falta de ética, moral e decência.

Ética? Moral? Decência? O que significam essas palavras???

Até a próxima.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

O resgate de uma cultura quase perdida

O carnaval de 2010 chegou ao seu final. Durante esses dias de folia passeei com minha família pela cidade procurando pelas atrações oferecidas na festa de Momo, e constatei que a cultura carnavalesca de minha geração (e também das gerações anteriores) praticamente se perdeu. Mas por que? Bem, vamos viajar no tempo e tentar entender o que houve...

Na minha infância, lá pelos anos 70, o carnaval macaense era marcado pela festa de rua e pelos bailes nos clubes e bares. Tudo começava no Reveillon no Redondo, Iate, Fluminense, Tênis e Ypiranga, onde orquestras e bandas embalavam os bailes ao som das marchinhas e sambas de enredo, prestigiados por milhares de foliões...normalmente esses lugares ficavam lotados. Depois, ao longo de janeiro e fevereiro, os clubes realizavam os bailes pré-carnavalescos A Noite do Azul e Branco, Noite Cigana, Noite do Havaí e Uma Noite em Bagdá. Finalmente vinham os bailes e os desfiles de escolas e blocos.

Os blocos desfilavam pela Rua Direita (Av. Rui Barbosa) e na Imbetiba, onde era realizada a Batalha de Confete no sábado antes do carnaval. O Bloco do Índio Maluco, o Bloco das Piranhas e o Bloco dos Bombeiros eram os principais, mas havia outros. Alguns grupos de mascarados eram recebidos ao som de "mascarado punga, cabeça de macumba". Duas figuras de destaque eram Batista e Juquinha, vestidos de mulher em lindos trajes e com maquiagem impecável.

Víamos pelas ruas a Boneca da Aroeira, o Hulk, os bois pintadinhos e grupos de foliões anônimos sujos de talco, batendo latas ou tamancos. Os desfiles das escolas de samba, tradicionalmente na Rua Direita, apresentavam a Princesinha do Atlântico, Unidos dos Cajueiros, Império da Barra e Acadêmicos da Aroeira, com suas respectivas baterias dando um show de rítmo e seus passistas mostrando o samba no pé.

Que sensação gostosa o cantar e dançar as marchinhas e sambas! E entre tantos compositores brasileiros maravilhosos como Mário Lago, Braguinha, Zé Keti e outros, nós temos o privilégio de listar entre eles, o nome de Benedito Lacerda, músico macaense da gema e autor, em parceria com Humberto Porto, de um dos grandes sucessos do carnaval, a marchinha "A Jardineira".

Dava gosto ver a figura de Seu Carnavalino, presença marcante nos bailes da cidade. E quantos de nós choraram ao ouvir, na madrugada da 4a-feira, os acordes de Cidade Maravilhosa, composição de André Filho, e que tradicionalmente era a última música a ser tocada, anunciando que o baile ia acabar.

Até os anos 80 essa movimentação se manteve, mas dos anos 90 em diante as coisas mudaram bastante, e o carnaval tradicional atravessou o samba. A meu ver foi uma combinação de fatores: a falta de visão das entidades de cultura da cidade, já que as marchinhas foram sendo esquecidas e deram lugar ao trio elétrico tocando a tal da "axé music"; os clubes perderam o interesse nos bailes, talvez por questões de ordem econômica; a Rua Direita deixou de ser o foco, virou um calçadão e os desfiles foram para outros lugares. Provavelmente há outros pontos que não citei mas que tiveram seu grau de importância nessa mudança de cenário.

Uma coisa que me chamou atenção nos festejos atuais, sobremaneira, é o que vou chamar de "juventude da lata": garotos e jovens de ambos os sexos, "se divertindo", em sua grande maioria, com latinhas de cerveja nas mãos, coisa que antigamente não era incentivada.

Bem, quando comecei o texto escrevi que "a cultura carnavalesca de minha geração (e também das gerações anteriores) praticamente se perdeu". Na verdade, há aqueles que estão se esforçando para resgatar essa cultura. A Imbetiba tem sido palco do Carnaval da Melhor (3a) Idade, com uma banda tocando as músicas que encantaram gerações, com participação maciça da família macaense e de visitantes de nossa cidade. Na Praia dos Cavaleiros, o Bloco do Benê anima os foliões com as marchinhas e sambas de outrora. O Tênis Clube de Macaé realizou um baile pré-carnavalesco e algumas matinês, incentivando os sócios a trazerem seus filhos para participarem desse espetáculo de cultura e tradição.

Ou seja, nem tudo está perdido. Há uma real mobilização pelo resgate do alegre carnaval macaense, que encantou tantas gerações. E termino essa crônica com a letra de "A Jardineira", dedicando a todas essas entidades que citei anteriormente uma salva de palmas pela iniciativa de manter acesa a chama do verdadeiro carnaval, aquele que deve ser comemorado com a família e os amigos, de forma sadia e sem excessos.

Ó jardineira porque estás tão triste
Mas o que foi que te aconteceu
Foi a camélia que caiu do galho
Deu dois suspiros e depois morreu

Vem jardineira vem meu amor
Não fiques triste que este mundo é todo seu
Tu és muito mais bonita
Que a camélia que morreu

Até a próxima!

terça-feira, 25 de agosto de 2009

A Quarta Onda

O escritor Alvin Tofler, no seu livro A Terceira Onda, oferece uma interpretação para grandes mudanças vivenciadas pela humanidade ao longo da história, apresentando a teoria ou a visão de que no passado a civilização teria vivenciado duas grandes revoluções ou “ondas”: a agrícola e a industrial.

A primeira onda, segundo sua teoria, iniciou-se no momento em que a civilização humana deixou os hábitos típicos do nomadismo, por volta de 10.000 anos atrás, e se tornou agrícola, adotando o sedentarismo. Ela durou, aproximadamente, até o século XVII.

A segunda onda veio em meados do século XVIII, quando iniciou-se na Inglaterra a Revolução Industrial, impulsionada pelos interesses de uma burguesia que buscava o lucro a partir da manufatura de produtos.

O mundo estaria, em nosso momento atual, passando por uma terceira onda, a da Sociedade da Informação, fundamentada em novos paradigmas e no estado-da-arte das tecnologias. Essa onda teve início em meados do século XX, onde informação e conhecimento passaram a ser uma forma de domínio por parte de países ou organizações. Computadores, biotecnologia, inteligência artificial, Projeto Genoma, clonagem e outros termos comuns em nosso dia-a-dia fazem parte desse cenário.

Pois bem, haveria uma quarta onda chegando? Como o livro do Tofler foi escrito em 1980 arrisco dizer que sim, e essa onda já chegou: é a era dos descartáveis!

O mundo vive atualmente a moda dos produtos descartáveis: fraldas, seringas, canudinhos, embalagens de alimentos, copos plásticos, toalhas de papel, luvas de borracha, pratos, talheres e uma lista interminável de objetos. Há quem defenda suas vantagens e há quem diga o contrário. Dizem que os descartáveis vieram para ficar...será? E o lixo gerado por essa geração de produtos, como fica?

Bem, polêmicas à parte, entendo que enquanto o conceito de descartável estava sendo aplicado apenas a produtos e utensílios, tudo bem. Percebo no entanto que adotou-se essa idéia em outras áreas, e como exemplo, basta ver muitos dos casamentos de hoje.

O casamento, como visto atualmente, parece se encaixar bem no conceito de descartável, e o casal já inicia sua vida em comum ouvindo a frase "se não der certo, separa". O exercício pleno de respeito, tolerância, paciência e amor propiciado pela relação dá muito trabalho, e a relação que poderia ser duradoura (até que a morte os separe) acaba rapidamente quando as partes não tem interesse em ceder. E assim vão aumentando as estatísticas de separações. Logicamente que há casos em que agressões e outras condutas ruins não justificam a união, mas isso é uma outra história.

Outro bom exemplo bastante interessante são os relacionamentos como o tal do "ficar", dos contatos virtuais, do sexo cibernético. Mas para que seriedade com essas coisas? Basta ficar com um ou com outro e tudo certo...será mesmo? As relações sexuais que deveriam ser praticadas com responsabilidade e amor, tornaram-se um nada, apenas para satisfazer prazeres momentâneos e são banalizadas pelas novelas, jornais e outros instrumentos de comunicação. Li outro dia num site que, assim como há a fast-food, há o fast-sex. Que coisa, não?!

O mais triste nisso tudo é ver como os seres humanos, no afã de serem "felizes", muitas vezes usam os outros sem nenhuma reserva e depois os descartam, como se isso fosse uma coisa comum. Parece até que a felicidade é um artigo manufaturado, comprado na prateleira do supermercado.

E como diz o poeta Lulu Santos: assim caminha a humanidade/com passos de formiga e sem vontade.

Até a próxima!

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Bolero e a ponte do Botafogo

Essa é uma daquelas histórias de família que merece ser contada. Ela tem por cenário a Macaé dos anos 40, quando a cidade ainda era pequena e pacata e nossos pais eram crianças/adolescentes.

Meu pai (Arão) conta que nessa época tinha uns 14 anos e morava no Visconde de Araújo de frente para a linha do trem, onde hoje fica a Costa do Sol. Ele tinha por hábito pescar em alguns lugares da cidade e nesse dia havia saído com seu pai (meu querido Vovô Pulchério) e um dos irmãos (Tio José) para pescar no Botafogo. Acompanhando o grupo vinha Bolero, um esperto cão viralata que era um grande companheiro deles. Aliás, até hoje não conheço um cão que não seja um grande companheiro de seu dono.

Papai com os cães Faísca e Sudem (1951)

Para se chegar ao pesqueiro desejado o caminho era bem simples: bastava seguir o traçado da linha do trem, que pode ser feito ainda hoje. Para quem não conhece o lugar, basta se dirigir até a antiga Estação Ferroviária, em frente à Praça Santos Dumont, no Miramar, seguir os trilhos em direção à Aroeira passando no sopé do Morro de Santana, atravessar a Rua Dr. Télio Barreto e continuar nos trilhos. A última etapa da caminhada consistia em atravessar a ponte do Botafogo, uma ponte de ferro construída sobre o Rio Macaé com uns 30 metros de comprimento. Por ela passavam os trens de passageiros e de carga que transitavam entre Macaé e a cidade de Campos, no Norte Fluminense. A ponte continua por lá mas os trens...

Quando chegaram à ponte, atravessaram-na como de costume, equilibrando-se nos dormentes e segurando nas ferragens enquanto o rio corria lá embaixo. Chegaram aonde queriam, pescaram à vontade e tomaram o caminho de casa. Tudo ia muito bem quando perceberam que um auto de linha, um pequeno vagão autônomo para transporte do pessoal de manutenção da antiga ferrovia, chegava em sentido contrário.

Como Bolero ainda estava atravessando a ponte, eles gritaram insistentemente para o maquinista. Ele o viu mas ao invés de reduzir a velocidade, nada fez. Suspense...o trem foi com tudo em cima do cão, que num ato desesperado pulou da ponte, de uma altura de uns 10 metros até chegar ao rio. Salvou-se!!! Os pescadores o aguardaram na margem. O susto foi grande mas o companheiro se saiu bem da prova e recebeu o merecido carinho pela proeza.

Meu pai conta que as pescarias no Botafogo continuaram com a companhia de Bolero, mas uma coisa mudou. Quando eles chegavam na cabeceira da ponte para atravessá-la, o cão, sem que ninguém dissesse absolutamente nada, descia até a margem e ia nadando pelo rio até o outro lado, fazendo o mesmo na volta. Como diz o dito popular "seguro morreu de velho, desconfiado está vivo até hoje". E isso vale até para os amigos caninos...

Bolero, além de outros cães como Faísca e Sudem, teve participação em outros momentos pitorescos com os "intrépidos" garotos da família...mas isso fica para uma outra oportunidade.

Até a próxima!

domingo, 14 de junho de 2009

Saudade dos campinhos e das brincadeiras de rua

Hoje andava de carro e observei alguns meninos e meninas por volta dos 9 anos, brincando despreocupadamente. Os meninos corriam atrás de uma bola de futebol e as meninas brincavam de bambolê, todos no meio da rua. Como tenho o costume de andar devagar, parei e fiz sinal para que eles me permitissem passar, o que transcorreu sem problemas.

Vendo essa cena, lembrei-me de meus tempos de criança na Macaé dos anos 70, quando tínhamos à disposição vários "campinhos", apelido carinhoso dado aos terrenos baldios que serviam de espaço para muitas brincadeiras e é claro, para as peladas de fim de semana.

Os campinhos estavam espalhados pela cidade, e cada bairro tinha pelo menos um. No Centro havia o Ernestão, perto da Fábrica de Móveis Sigla (hoje Supermercado ABC), o campo do Luiz Reid (sem o muro naquela época), o campinho atrás do Matias Neto, o da Destilaria (hoje a FIAT) onde todo domingo jogavam "times de camisa" e vários outros. Ao lado de minha casa, no Visconde de Araújo, havia um que era palco de peladas entre nós ou de nosso time contra o das outras ruas vizinhas. Seu apelido era Beira-Morobá, e um dia espero explicar o porquê do nome.

Os emocionantes jogos no campinho só terminavam quando escurecia o suficiente para não enxergarmos a bola e não haver mais condição de brincar. A vontade de continuar jogando era tanta que saíamos daquela escuridão e íamos para o meio da rua. Fracamente iluminada pelas luzes incandescentes dos antigos postes de madeira, a rua de terra batida se tornava um prolongamento do campo e das sensações que só quem vivenciou uma autêntica pelada poderia descrever.

Como só havia um carro por ali, que era de Seu Demétrio, o trânsito era mínimo. As sandálias havaianas serviam de trave e tudo recomeçava para os craques mirins e a querida e suja bola dente-de-leite. A festa ia bem até a hora em que se ouvia as mães chamando: "vem pra dentro menino, que amanhã tem aula."

Os campinhos serviam para o pique, pular corda, polícia e ladrão, bola de gude, pião, soltar pipa, para as partidas de queimado e muitas outras brincadeiras. Era o ponto de encontro mais desejado da gurizada, que nem nos dias de chuva era esquecido. Eu gostava de levar uns barquinhos de plástico para brincar no campinho molhado junto com os colegas, e usando algumas ferramentas improvisadas como paus e pedras, ia interligando as poças d'água, construindo canais, talhando diques e docas para os barquinhos. Acho que o gosto pela Engenharia vem de muito longe.

Bem, deixemos os anos 70 e vamos retornar a 2009, em pleno século XXI e cenário de novas tecnologias e costumes.

E agora, em tempos de "Capital Nacional do Petróleo", e também de buracos, alagamentos, inchaço demográfico, bandidagem e outras mazelas urbanas, o que temos a oferecer às nossas crianças? Os campinhos se tornaram prédios residenciais, lava-jatos, estacionamentos etc. As brincadeiras do passado foram esquecidas em grande parte e substituídas por programas de tv de qualidade bastante duvidosa, diga-se de passagem, pelos computadores, videogames e internet. As brincadeiras comuns a todas as crianças ficaram apenas para algumas de comunidades menos favorecidas que ainda soltam pipa ou como atividade de Escolas. Parece que não sobrou muito para nossos filhos...

Hoje, relembrando os tempos românticos da Macaé de minha infância, onde as grandes tecnologias eram o rádio de pilha e a tv preto e branco, vejo que nós todos poderíamos ser chamados de "meninos e meninas de rua", na acepção mais ampla da expressão. E acima de tudo, felizes!!!

Até a próxima.